quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

O corpo e a Alma

    Havia um aperto em meu peito. Eu estava presa em uma caixa de vidro. A caixa de vidro estava em um quarto escuro. Eu estava sem chance alguma de sair. 
    A cada minuto minha respiração ficava mais pesada e me fazia sentir como se não tivesse mais lugar para mim dentro do meu próprio corpo. Eu estava me perdendo por falta de espaço. Então gritei a todo pulmão e ninguém podia ouvir-me, bati no vidro e tentei voltar para dentro de mim, mas meu corpo já não se encaixava mais, eu havia mudado de forma e textura. 
    Nos dias em que se seguiram, enquanto estava trancada fiquei observando o que costumava ser eu caída a meu lado, me trazendo calafrios, medos e uma tempestade de incertezas. Eu tentava sair, gritava, chutava e me jogava contra as paredes da caixa. Eram tão sólidas e as batidas de minha alma contra o vidro, abriam feridas no que restara de mim.  
    Mais alguns dias se passaram e minha antiga carne entrou em estado de decomposição e naquele momento, quando o cheiro de morte começou a se espalhar uma certeza se iluminou em minha cabeça. Eu iria morrer. Eu queria morrer. Toda vez que eu pensava em como sair da caixa, eu pensava em uma maneira de morrer, e cada vez que pensava na morte, uma paz imensa se aconchegava em meu peito, quase como se minha vida fosse começar depois que eu morresse. Com o tempo a morte passou a ser minha melhor amiga, pois embora, ela se rejeitasse a me levar de uma única vez, todo dia ela voltava e me fazia companhia, me contava histórias e ao fim de nosso encontro, levava um pedaço de minha alma. A morte fazia parte de mim agora, eu respirava, transpirava e cheirava a morte. A caixa de vidro estava cada dia menor e em um dia ela estaria tão pequena que a morte teria de me levar com ela e eu estava contando os segundos. Mas um dia a morte não apareceu. 
     O que apareceu foi outra caixa e em seu interior, com olhos arregalados e um jeito de quem não dormia a dias, ou quem sabe anos, havia um corpo. Parecia maltratado e esquecido de canto, a alma que o habitava, se escondia, mas aos poucos foi saindo para conversar com a minha. A morte parou de me visitar. Eu sentia sua falta, eramos boas amigas, mas o que habitava aquela nova caixa me trazia ainda mais calma e paz do que pensar na morte. Era uma paz boa, do tipo que eu nunca havia sentido e a cada dia que passava mais tempo eu precisava passar com aquele corpo e sua alma tímida. Minhas feridas estavam se curando e sentimentos bons tomaram conta de minha caixa. Eu queria fugir dali e trazer aquele corpo comigo. Eu era alma e ele era o corpo, podíamos se tornar um se ele sentisse o mesmo, mas a distância formada pelos vidros, tornavam nosso amor impossível. Sem perceber estávamos cada vez mais próximos e mesmo sem poder se tocar, já eramos um ser só. A cada dia que passa os nossos vidros vão se rachando, levando o amor de um para o outro e quando finalmente estiverem juntos, sem vidros, estarão completos, o corpo e a alma.

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