quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Vida

 
    Joanna andava olhando para seus próprios pés, contando cada passo dado e evitando cada olhar que lhe era enviado, observava o chão, mas também amava o céu e na sua imensidão se perdia. Era oito ou oitenta, era para o alto ou para baixo, era triste e feliz ao mesmo tempo, era mal de uma jeito bom, e boa de um jeito mal, era simplesmente Joanna. 

   Olhando para o céu pela janela do ônibus, via seu reflexo no pôr do sol, enquanto ao som de Esteban e Cícero, Joanna imaginava sua vida, o que já vivera e o que viverá, como em um videoclipe, clichê, clichê dos pés a cabeça, sorria e chorava, Joanna nada mais era do que humana, mas algumas pessoas não entendem o que ser humano significa, não respeitaram o espaço de Joanna, que nasceu em corpo de Pedro, mas sua alma sempre fora de Joanna.
    Pobre menina, se sentia deslocada, nem seu corpo era seu, sofria, mas sabia o que queria, ela queria ser ela, mesmo que aparentemente algumas pessoas, simplesmente, não conseguiam enxergar. Pedro era Joanna com o corpo trocado, a menina sofria, se escondia e fingia que não era com ela, quando era agredida por turbilhões de sentimentos, que eram resultados do preconceito e da intolerância.
     Cansou de passar os intervalos da escola escondida, e quando a vontade de ir no banheiro apertava, ela se segurava, pois não havia lugar para ela no mundo, nem mesmo para suas necessidades básicas. Nascida na periferia, negra, pobre e transexual, Joanna sonhava com sua liberdade, o dia em que Pedro a soltaria do carcere privado, mas andava difícil, quando podia dar uma voltinha, o medo batia e Pedro voltava e a amarrava, e não estava errada em sentir medo, mas não por ser Joanna, mas sim por ser humana. 
     Paus, pedras e chutes, cinco, cinco, cinco caras com a sua auto estima abalada, espancaram a garota, e a mandaram virar gente, puxavam seus cabelos e batiam em seu rosto, enquanto lágrimas escorriam pelo rosto da menina, sangue saia do seu nariz e naquele momento, ela decidiu que a morte era tudo que queria, fechou os olhos e deixou a dor tomar conta do seu ser.
     Falha, alguém chegou para a socorrer. Irritada e frustrada, não queria ser salva, queria sumir fisicamente, queria dar um fim a quem sonhava em ser, pois quando não se é aquilo que se quer, nada somos além de corpos vazios, e sujos pelas mãos da intolerância e do medo.
    Depois de ser hospitalizada e espancada mais duas vezes, Joanna decidiu que essa era sua vida e que se ser quem se quer ser custa tanto, ela pagaria o preço que fosse, e assim aos poucos se libertou, aprendeu com a dor e levantou, mostrou que se com dor precisaria aprender, assim ela aprenderia. E aprendeu, aprendeu que é dificil viver em meio ao ódio, ao desespero e o preconceito e que o melhor remédio para isso é o amor.
     Joanna se levantou e foi em direção a porta, a garota desceria do ônibus no próximo ponto onde encontraria suas manas para celebrarem a vida, a vida como se é, a vida como se quer ser vívida.

2 comentários:

Eloísa Cardozo disse...

Teste

Caroline Sant disse...

Mds garota, me beija <3
Que texto lindo, fiquei com aquela imensa vontade de abraçar a Joanna (coisas de leitora) hsauhsuh você arrasa <3